Séries de Potências

Doherty Andrade

\section{Séries de funções}

Consideremos funções $f_n:X\rightarrow \R$ e a série de funções
$\displaystyle\sum_{n=1}^\infty f_n(x)$. Dizemos que a série
converge pontualmente para função $f:X\rightarrow \R$ se a sequência
$(s_n)$ das somas parciais converge pontualmente para $f$, onde
$s_n=\displaystyle\sum_{k=1}^nf_k(x)$.

De modo análogo, a série converge uniformemente para afunção $f$ se a
sequência das somas parciais $(s_n)$ converge uniformemente para
$f$.

O critério de Cauchy para sequências pode
ser também aplicado a convergência de séries:

\begin{thm}[Cauchy] Consideremos funções $f_n:X\rightarrow \R$. A série $\displaystyle\sum_{n=1}^\infty f_n(x)$
converge uniformemente em $X$ se, e somente se, existe $k_0$ natural
tal que se $m,n \geq k_0$ então
$$ \left| \sum_{k=m+1}^n f_k(x)\right| < \epsilon, \forall x \in
X.$$
\end{thm}


Dizemos que a série de funções $\displaystyle\sum_{n=1}^\infty
f_n(x)$ converge normalmente em $X$ se existem reais não-negativos
$a_n$ tais que $$|f_n(x)| \leq a_n, \forall n, \forall x \in X.$$
satisfazendo $\displaystyle\sum_{n=1}^\infty a_n< \infty. $


Consideremos as funções $f_n(x)=\di\frac{\sin(nx)}{n^2}, x\in
[0,1]$. A série $\displaystyle\sum_{n=1}^\infty f_n(x)$ é
normalmente convergente, pois $\vert f_n(x)\vert \leq
\frac{1}{n^2}=a_n$ além disso, $\displaystyle\sum_{n=1}^\infty
\frac{1}{n^2}$ é convergente.

\begin{thm}[Weierstrass] Se a série $\sum_{n=1}^\infty f_n(x)$ é normalmente convergente em $X$, então $\sum_{n=1}^\infty f_n(x)$ e
$\sum_{n=1}^\infty \vert f_n(x) \vert $ são uniformementes convergentes em $X$.
\end{thm}

\section{Séries de potências}
As séries de potências são casos particulares de séries de funções.
Denominamos série de potências em torno do ponto $x_0$ as séries de
funções $\sum_{n=1}^\infty f_n(x)$ onde $f_n(x)= a_n(x-x_0)^n.$

As funções $f_n$ são polinômios e portanto,estão definidas para todo
$x \in \R$. A questão que surge é: para quais valores de $x$ a série
de potências converge pontualmente ou uniformemente. Vamos responder
a estas questões.

Para cada $x$ fixado, o teste da raiz nos dá:

(a) se $L=\limsup_{k
\to \infty}\sqrt[k]{|a_k|}|x-x_0|<1$ a série converge.

(b) se $L=\limsup_{k \to \infty}\sqrt[k]{|a_k|}|x-x_0|>1$ a série
diverge.

Ao número $R$ definido por
$$ R= \frac{1}{L}=\frac{1}{\limsup_{k \to \infty}\sqrt[k]{|a_k|}}$$ chamamos de
raio de convergência.

Portanto, a série converge pontualmente (e absolutamente) no
intervalo $(x_0-R, x_0+R)$, com a convenção $R=\infty$ se $L=0$.

A convergência uniforme das séries de potências pode ser obtida pelo
teste de Weierstrass.

\begin{thm}Seja $\sum_{n=1}^\infty a_n(x-x_0)^n$ uma série de
potências em torno de $x_0$ e $X$ um conjunto limitado tal que
$\overline{X}$ esteja contido em $(x_0- R, x_0+R)$, onde $R$ é o
raio de convergência da série. Então, a série converge uniformemente
em $X$.
\end{thm}


Seja $\alpha= \sup{ |x-x_0|; x \in X }$. Segue que $\alpha <R$.
Como $|a_k||x-x_0|^k\leq |a_k|\alpha^k, \forall x \in X$, então
$\limsup_{k \to \infty}\sqrt[k]{|a_k|\alpha}<1.$ Logo, a série
numérica $\sum_{n=1}^\infty a_n\alpha^n$ é convergente e concluímos
a convergência uniforme da série de potências pelo teste de
Weierstrass.

Note que sob as condições do teorema acima, como as funções $s_n(x)
=\displaystyle\sum_{k=1}^nf_k(x)$ são contínuas, segue que a função
definida pela série é contínua, pois é limite uniforme de funções
contínuas.

Prova-se que vale mais do que continuidade. As funções definidas
por séries de potências são infinitamente deriváveis no intervalo de
convergência e suas derivadas são obtidas derivando a série termo a
termo.

\begin{thm}Seja $\sum_{n=0}^\infty a_n(x-x_0)^n$ uma série de
potências em torno de $x_0$ com raio de convergência $R$. Seja
$f:(x_0-R,x_0+R) \rightarrow \R$ a função definida pela série de
potências. Então, $f$ é derivável e $f'(x)$ é dada por
$\sum_{n=1}^\infty na_n(x-x_0)^{n-1}$ e tem o mesmo raio de
convergência $R$.

Resultado análogo para integração.
\end{thm}

Note que $f^{(k)}(x)= \di\sum_{n\geq k}^\infty n(n-1)(n-2)\cdots
(n-k+1))a_n(x-x_0)^{n-k}$ para todo $k\geq 1$ e em particular
$f^{(k)}(x_0)= k(k-1)(k-2)\cdots (1))a_k$. Ou seja,
$a_k=\di\frac{f^{(k)}(x_0)}{k!}.$

Assim, o polinômio $p_n(x)=\di\sum_{k=0}^n a_k(x-x_0)^k$ é o
polinômio de Taylor em torno do ponto $x_0$ da função
$f(x)=\di\sum_{n=0}^\infty a_n(x-x_0)^n.$

Observe que este resultado permite demonstrar a unicidade na
re-pre-sen-tação em séries de potências. Isto é, se duas séries
de potências são iguais, $\sum_{n=0}^\infty
a_n(x-x_0)^n=\sum_{n=0}^\infty b_n(x-x_0)^n$, então elas representam
a mesma função. De fato, tendo o mesmo raio de convergência, suas
derivadas de todas as ordens são iguais no intervalo de
convergência, e portanto definem a mesma função.

Portanto, se a série de potências $\di\sum_{n=0}^\infty
a_n(x-x_0)^n$ possui raio de convergência $R>0$, então ela é a série
de Taylor, em torno do ponto $x_0$, da função
$f:(x_0-R,x_0+R)\rightarrow \R$ definida pela série.
Algumas séries de Taylor.
\begin{enumerate}
\item Vamos determinar a série de Taylor de $f(z)= \expo{x}$ centrada em
$x=0$. Como $f^{(n)}(0)= 1, \forall n$ segue que $\expo{x}$ tem a
série de Taylor dada por $\di\sum_{0}^\infty \frac{x^n}{n!}.$

\item Consideremos a função $f(x)= \di\frac{1}{1-x}$. Por sucessivas
derivações obtemos
$$f^{(n)}(x)= \frac{n!}{(1-x)^{n+1}}.$$
Se $x=0$, obtemos $f^{(n)}(0)= n!$ e assim temos
$$ \frac{1}{1-x}= \sum_{n=0}^\infty x^n.$$

\item Se quisermos a série de Taylor da função $f(x)=
\di\frac{1}{1-x}$ centrada em $x=-1$, basta calcular as derivas
$f^{(n)}(-1).$ Como $$f^{(n)}(-1)=\frac{n!}{(1+1)^{n+1}},$$ usando o
teorema da fórmula de Taylor temos
$$ \frac{1}{1-x}= \sum_{n=0}^\infty\frac{( x+1)^n}{(1+1)^{n+1}}=\sum_{n=0}^\infty\frac{( x+1)^n}{2^{n+1}},$$
para $|x+1|<1.$
\item A série de Taylor de $f(x)=\di \frac{1}{x}$ como potências de
$(x-1)$. Novamente, por sucessivas derivações obtemos
$$f^{(n)}(x)= \frac{(-1)^n n!}{x^{n+1}},$$
portanto, $f^{(n)}(1)= (-1)^n n!$.

Segue que $\di \frac{1}{x}=\sum_{n=0}^\infty (-1)^n(x-1)^n,$ para
$|x-1|<1.$
\end{enumerate}

Algumas funções e suas séries de
Taylor centradas em $x=0$.
\begin{itemize}

\item $\di \expo{x}= \sum_{n=0}^\infty \frac{x^n}{n!}.$

\item $\di \cos(x)= \sum_{n=0}^\infty \frac{(-1)^nx^{2n}}{(2n)!}.$

\item $\di \sin(x)= \sum_{n=0}^\infty \frac{(-1)^nx^{2n+1}}{(2n+1)!}.$

\item $\di \frac{1}{1-x}=\sum_{n=0}^\infty x^n.$
\end{itemize}

\section{Aplicações}

(1) Cálculo de integrais: Avaliar a $\displaystyle \int_{-\pi}^\pi \frac{\sin(x)}{x}dx$. Veja o gráfico a seguir. Note que a função $f(x) = \frac{\sin(x)}{x}$ é contínua em toda reta real, em particular em $x=0$.

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$$\int_{-\pi}^\pi \frac{\sin(x)}{x}dx\approx \int_{-\pi}^\pi \frac{1}{x}\left[ \frac{x }{1}- \frac{x^3}{3!}+ \frac{x^5}{5!} -\frac{x^7}{7!} \right] dx$$

$$\int_{-\pi}^\pi \frac{\sin(x)}{x}dx\approx\int_{-\pi}^\pi \left[ 1- \frac{x^2}{3!}+ \frac{x^4}{5!} -\frac{x^6}{7!} \right] dx$$

$$\int_{-\pi}^\pi \frac{\sin(x)}{x}dx\approx \left[ x- \frac{x^3}{2!}+ \frac{x^5}{4!} -\frac{x^7}{6!}\right]_{-\pi}^\pi \approx 3.687 .$$

(2) Solução de EDOs: para exemplificar vamos tomar o PVI simples dado por \begin{cases} y^\prime -y =0\cr y(0)=1.\end{cases}

Vamos supor que a solução seja dada em forma de uma série de potências $$y(x)= \sum_{k=0}^\infty a_kx^k.$$

Como $y(0)=1$, segue que $a_0=1.$

Supondo $x$ dentro do raio de convergência, podemos derivar a série: $$y^\prime (x)= \sum_{k=1}^\infty k a_kx^{k-1}.$$ Substituindo na EDO, obtemos:

$$ (a_0+a_1)+(a_1+2a_2)x+ (a_2+3a_3)x^2+\cdots + (a_{n-1}+ na_n)x^{n-1} +\cdots =0.$$

De onde segue que $a_1=1, a_2 = \frac{1}{2}, a_3 = \frac{1}{6}, a_4= \frac{1}{4!}$, e em geral, $a_k=\frac{1}{k!}.$

Segue que $y(x) =\sum_{k=0}^\infty \frac{x^k}{k!},$ sendo portanto $y(x)= \mbox{e}^x.$

Referências

[1] D. G. de Figueiredo, Análise de Fourier e
equações diferenciais parciais. Projeto Euclides, (1997).

[2] Avner Friedman, Foundations of Modern Analysis.
Holt, Reinehart and Winston, Inc., 1970.

[3] M. H. Protter e C. B. Morrey. A first course in Real Analysis. Springer, 1977.

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